A Inundação

 

A Inundação 


Sob céus de chumbo, nuvens descem manto,

Rios se alargam, tomam vastidão.

Da terra fértil, vem um pranto,

Na fúria d’água, nasce a escuridão.


Chuva incessante cai sem hesitar,

Súplicas são sussurros na tormenta,

Desfeitos lares, sons de lamentar,

Em vasto mar a vida se apresenta.


Os campos que outrora deram sustento,

Agora afogam-se em ondas fatais,

Gado e lavoura em tormento,

Somem-se as linhas, não há mais.


Nas ruas surge o caos incontido,

Portas se abrem para o mar voraz,

Crianças choram, sem abrigo,

Busca-se um fim, um porto audaz.


Árvores, raízes, laços partidos,

Vão na correnteza, sonhos também.

Ponteiros param, minutos perdidos,

A esperança luta, clama por além.


Sombras de barcos em telhados surgem,

Gente ao clamor de socorro ecoa,

Em cada rosto um desejo urge,

De ver a calmaria que perdoa.


Cidades morrem, sem poder gritar,

Tornam-se lendas em águas plenas,

Memórias submersas a murmurar,

Histórias perdidas em cenas amenas.


Riachos antes tímidos, serpentes,

Hoje são monstros a devorar,

O que foi belo, agora ausente,

Nas águas turvas, a vida a buscar.


Anjos de aço, hélices no céu,

Desafiam ventos, águas e o fim.

Levam esperança, toque fiel,

No mar de lágrimas, clarão de enfim.


Corações batem, um só destino,

Na correnteza, união se vê.

Braços que salvam, traçam o hino,

Da resistência ao que é sofrer.


O mar revolto, em breve passará,

Deixando rastros de dor e pranto,

Mas na firmeza que sempre há,

Surge o renascer em cada canto.


Silêncio depois da tempestade,

Água que volta ao seu caudal.

Natureza impõe sua vontade,

Mas há resiliência no final.


Lágrimas secam no rosto marcado,

Cicatrizes doem, mas vão sumir,

A vida brota do solo alagado,

Com nova força para prosseguir.


Renasce a cidade, alma ferida,

Transformada pelo vendaval.

Do caos, ergue-se a vida,

Fortalecida em seu ritual.


Entre as águas, a história é talhada,

No coração de quem viveu.

Inundação, memória marcada,

Lição que o tempo concebeu.


Por fim, quando a calma se instala,

E a vida volta ao seu compasso,

Fica a lembrança, a dor se cala,

E o homem aprende em cada passo.